Às vezes me sinto montando um quebra-cabeças com a minha vida. Procurando pelas peças que faltam, pelas peças que se encaixam e por aquelas que irão completar blocos de sentido, formando um todo integrado, coerente, inteligível.
De vez em quando, passo meu tempo a procurar peças que se encaixem umas nas outras. Esses são os momentos em que quero dar sentido ao que experimento ao longo dos dias. Procuro partes de mim que juntas podem me trazer um pouco mais de tranquilidade, de serenidade. Na maioria das vezes, não encontro tantas quanto gostaria e passo ao drama de forçar o encaixe e de me fazer acreditar que as coisas estão de acordo com o que quero. No fim, a sensação é de que estou trapaceando no jogo de montar quebra-cabeças, tentando distorcer as peças a ponto de fazer com que peças se encaixem onde não deveriam se encaixar. E às vezes, por incrível que pareça, faço isso muito bem.
O trabalho de dar novo significado às experiências, histórias e fatos do dia a dia, que talvez seja realmente trapacear, alterando o formato das peças, não deixa de ser necessário. Afinal, creio que não seja apenas eu a colecionar episódios desagradáveis, que a princípio gostaria de esquecer, mas que não sendo esquecidos, são alterados, digeridos e vomitados num outro formato, tomando também sua parte, junto a outras pecinhas, na construção de mim mesmo.
Algumas vezes, peças que pareciam estar encaixadas, como que por mágica, tornam-se completamente desencaixadas e por mais que eu tente devolvê-las à sua posição original, não consigo e acabam no amontoado de peças com que lidarei depois. Nesse amontoado estão as peças abandonadas, ou por não fazerem mais sentido no todo, ou por nunca terem realmente feito sentido, ou porque ainda não sei onde colocá-las.
Há vezes em que sonho que nessa de montar meu quebra-cabeças, vejo peças novas surgindo. Nunca param de surgir. Peças vão se acumulando ao meu redor. Algumas delas tomam o lugar de peças que já estavam encaixadas e há outras que ao surgirem perturbam o encaixe de todas as outras peças, obrigando-me a começar a montar tudo de novo. Os sentidos, os significados, as histórias, os julgamentos, tudo, tudo precisa ser refeito.
Eu sei que poderia escolher ficar apenas com o pedaço que já foi montado, mas quando olho para os lados e vejo tantas outras peças ainda soltas, dispersas ou amontoadas, fico incomodado e curioso para descobrir que imagens e experiências elas compõem, e a que vida serei apresentado no momento em que as novas peças forem encaixadas. Mais de uma vez me vejo tendo que abandonar um pedaço e começar do zero um outro, com novas peças e novos encaixes.
Não posso reclamar. Gosto do que vejo e gosto de me ver diante de tantas peças, cada uma delas carregando em si a possibilidade de fazer com que o quebra-cabeças da minha história seja mais interessante, mais rico, mais cheio de vida. Já não acredito que um dia terminarei esse trabalho, mas, de certa forma, isso é tranquilizador.
Ótima analogia !!! Nunca tinha pensado na vida como quebra-cabeças. Olha que faz muito sentido,hem. Dentro deste contexto parei e pensei: Já tentou comprar um jogo de quebra-cabeças para adultos? Todos são > de 1000 peças, rsrs
ResponderExcluirBoo... Confesso que nunca tive muita paciência pra quebra-cabeças assim. Lembro que uma das minhas irmãs uma vez estava montando um enorme em casa, e ficou faltando uma pecinha. Desespero, viu? Ainda bem que achou dentro do saco do aspirador, acredita? hehe.
ResponderExcluirSou muito pouco paciente nesse processo todo de encaixe das novas peças.